Economia Brasileira na Primeira República

Imagem em preto e branco retratando uma fazenda de café na cidade brasileira de Vassouras, ilustrada por Louis-Jullien Jacottet em 1861. A cena mostra um grande edifício de dois andares com várias janelas e uma estrutura triangular no topo. Em frente ao edifício, há várias pessoas vestindo roupas da época, algumas andando e outras em pequenos grupos, sugerindo uma cena social ou de trabalho. Árvores e vegetação circundam a propriedade, e há uma colina arborizada ao fundo. Um pequeno riacho atravessa a frente da cena, com pedras visíveis e uma leve cachoeira, adicionando um elemento natural à paisagem da fazenda. A imagem tem um ar nostálgico e histórico, capturando um momento específico no tempo da vida rural brasileira do século XIX.
Uma fazenda de café na cidade de Vassouras, retratada por Louis-Jullien Jacottet em 1861. O café era o principal cultivo brasileiro na época. Domínio público.

A Primeira República brasileira, também conhecida como “República Velha”, durou de 1889, com a deposição do imperador Dom Pedro II, até 1930, quando um golpe de Estado levou Getúlio Vargas ao poder. Durante esse período, o Brasil continuou a ser um grande produtor de café. No entanto, também se observou o declínio da produção de borracha e a ascensão de inúmeras indústrias têxteis e de alimentos no país. A política econômica no período sofreu forte influência dos setores cafeicultores, mas, por vezes, seus interesses eram desafiados pelo governo. Como um todo, a Primeira República foi uma época de grandes transformações econômicas, e ela abriu o caminho para mudanças ainda mais profundas que ocorreriam na Era Vargas (1930-1945).

As dificuldades de liquidez ao fim do Império

Nas décadas finais do Segundo Reinado, o Brasil vivenciou uma grande expansão do trabalho assalariado, em meio à abolição da escravidão. Ao passo que escravos pouco precisam de dinheiro, os assalariados dependem dele para a sua subsistência. Com isso, passou a existir uma maior demanda por dinheiro na lavoura — em especial, durante a época das colheitas, quando os trabalhadores agrícolas costumavam ser pagos. Todavia, a economia brasileira não dispunha de papel-moeda suficiente para atender a essa demanda, o que acarretou problemas de liquidez no país. Dois fatores agravavam esse cenário:

  • Havia poucos bancos, e eles estavam concentrados na cidade do Rio de Janeiro. Sazonalmente, o dinheiro era redirecionado para o interior do país.
  • As pessoas preferiam acumular dinheiro, em vez de mantê-lo sob a forma de depósitos bancários. Assim, quando confrontados por uma maior demanda por papel-moeda (vinda da lavoura), os bancos tinham de reduzir seu encaixe (dinheiro em caixa) para atendê-la. Havia, portanto, a “inelasticidade do meio circulante”, pois o crédito não se expandia adequadamente.

Para sanar a baixa liquidez, uma lei de 1885 autorizou o Tesouro Nacional a emitir dinheiro para emprestar aos bancos, até o limite de 25 mil contos, a moeda brasileira. Entretanto, essa medida teve efeito apenas temporário.

Havia duas perspectivas sobre como enfrentar os males econômicos. Para os “papelistas”, dever-se-ia emitir mais moeda para que toda a demanda por dinheiro fosse atendida. Por outro lado, para os “metalistas”, emitir moeda significaria desvalorizá-la, na prática confiscando o poder de compra dos cidadãos. Por isso, eles defendiam a adesão do Brasil ao padrão-ouro, um sistema que impediria quaisquer emissões de moedas caso não houvesse ouro suficiente para garanti-las. Em especial, defendia-se a cotação na paridade definida em 1846, de 27 pence (moeda britânica) por mil-réis (moeda brasileira).

Em 1888, foi promulgada uma Lei Bancária que tentou conciliar as duas perspectivas monetaristas. Embora ela não tenha sido bem-sucedida, o Brasil conseguiu atingir a paridade de 1846 durante o Gabinete Ouro Preto, um dos governos durante o Período Imperial. Esse gabinete aproveitou-se da bonança econômica para restabelecer o padrão-ouro e oferecer créditos à lavoura, em uma tentativa de impedir a proclamação da República. Contudo, em 1889, setores militares aliaram-se a setores civis e derrubaram o imperador Dom Pedro II.

O Encilhamento e suas consequências

Quando a República foi proclamada, o Brasil ainda vivia uma crise de liquidez. Para tentar solucioná-la, o primeiro ministro da Fazenda do país, Rui Barbosa, implementou o Encilhamento em 1890, a partir de uma série de decretos.

O Encilhamento foi a flexibilização da emissão de papel-moeda, que seria limitado e garantido por títulos públicos. Na prática, o governo estaria autorizado a colocar mais dinheiro em circulação na economia, desde que ele estivesse atrelado à oferta de crédito para projetos industriais. Além disso, os bancos estariam autorizados a participarem do capital das empresas. Ainda que se imaginasse o potencial de essa medida causar inflação, acreditava-se que isso poderia ser mitigado pela forte demanda por moeda e pelo crescimento industrial.

Esse plano econômico inspirava-se no sistema de bancos nacionais dos Estados Unidos, que havia sido criado em 1863 e 1864 pelos National Bank Acts. Essas leis também permitiam que os bancos emitissem moeda com lastro em títulos da dívida pública do governo. Para implementar a mesma ideia no Brasil, o país foi dividido em várias regiões bancárias, e cada uma delas teria um banco distinto sendo responsável por emitir moeda. Por exemplo, na região central, o banco responsável seria apenas o Banco dos Estados Unidos do Brasil (BEUB). Após essa regionalização inicial ser tida como insuficiente, o Banco do Brasil (BB) e o Banco Nacional do Brasil (BNB) também ganharam poderes de emissão.

É verdade que o Encilhamento gerou muitas firmas viáveis e levou ao início de um processo de industrialização por substituição de importações. No entanto, a expansão da base monetária teve efeitos rápidos e violentos, que se somavam ao contexto adverso da época:

  • Inflação maior do que a esperada: A expansão industrial esperada pelo governo não aconteceu adequadamente, pois foram criadas muitas empresas de fachada. Além disso, os imigrantes e antigos escravos não tinham tanta demanda por moeda, pois sua renda era diminuta ou inexistente. Houve uma tentativa de liquidar os projetos industriais de má qualidade, por meio da fusão entre o Banco dos Estados Unidos do Brasil (BEUB) e o Banco Nacional do Brasil (BNB), formando o Banco da República dos Estados Unidos do Brasil (BREUB). Todavia, isso não deu certo, porque os sucessores de Rui Barbosa no Ministério da Fazenda, Alencar Araripe e o Barão de Lucena, não mantiveram a política de saneamento bancário.
  • Desvalorização do câmbio: Como havia mais papel-moeda brasileiro em circulação, o valor individual dele diminuiu. Assim, a taxa de câmbio passou de 27 pence por mil-réis para 12 pence por mil-réis. Outros fatores que prejudicavam o câmbio brasileiro eram o colapso da casa britânica Baring Brothers, que operava na Argentina, provocando fuga de capitais na América Latina; a instabilidade política no Brasil; a queda no preço do café; e o crescimento da dívida externa brasileira (necessária para manter o nível de importações diante da queda no preço do café).

Devido a essas mazelas, o Encilhamento ficou conhecido como um plano fadado ao fracasso. De fato, seu próprio nome é pejorativo, porque faz alusão ao momento de preparação dos cavalos para o páreo, como se a economia brasileira estivesse sendo preparada para um período de especulação desenfreada, tal qual as apostas nas corridas de cavalos. O termo “Encilhamento”, nessa acepção negativa, foi concebido por monarquistas que queriam menosprezar a República.

Durante o governo de Prudente de Moraes (1894-1898), houve uma tentativa de conciliar as perspectivas papelista e metalista. Ele negociou e obteve um empréstimo de 7,5 milhões de libras esterlinas junto aos banqueiros Rothschild, da Inglaterra. Em troca, o Brasil deveria implementar medidas de austeridade, tais como o aumento de impostos — o que foi feito na Lei Bancária de 1895. Entretanto, esse empréstimo também não resolveu a crise de liquidez do Brasil.

O primeiro Funding Loan e a Era de Ouro

Os problemas brasileiros acabariam a partir de 1898, quando o governo Campos Sales (1898-1902) chegou a um acordo com os Rothschild e com o London and River Plate Bank. O Brasil argumentou não ser capaz de pagar a sua dívida externa, e conseguiu o primeiro Funding Loan — um empréstimo de até 10 milhões de libras esterlinas, a partir da emissão de títulos públicos, com juros de 5% ao ano. A partir de 1898, durante 3 anos, o Brasil não estaria obrigado a pagar nem o principal das dívidas renegociadas, nem os juros sobre elas. Nos 10 anos subsequentes, o país apenas pagaria os juros, enquanto o pagamento do principal continuaria suspenso. Posteriormente, após esses 13 anos, as dívidas e juros deveriam ser pagos ao longo de 50 anos. Ademais, houve a emissão dos chamados rescission bonds: títulos públicos que seriam oferecidos aos donos de ferrovias brasileiras, como garantia de lucros para esse setor pouco lucrativo.

Para ceder esse empréstimo, os credores fizeram duras exigências ao Brasil, que deveria ajustar as contas públicas e tirar papel-moeda de circulação. Além disso, o governo estaria proibido de contrair novos empréstimos até 1901. A garantia do empréstimo eram as rendas da Alfândega do Rio de Janeiro.

Devido a essas contrapartidas, o primeiro Funding Loan sofreu resistência no parlamento brasileiro, em especial pelos cafeicultores, que dependiam do apoio do governo. Apesar disso, o acordo foi aprovado com a anuência de paulistas e mineiros, que controlavam a política na época, e foi executado de forma ortodoxa pelo Ministro da Fazenda Joaquim Murtinho. Ele acreditava que as empresas inaptas deveriam ser eliminadas do mercado e, por isso, não titubeou ao implementar medidas de forte contração monetária, aumento de impostos, e corte de despesas públicas. Assim, sucedeu-se a apreciação do câmbio e uma onda de falências bancárias — gerando efeitos deletérios imediatos e contribuindo para a crescente impopularidade do presidente Campos Sales.

Por outro lado, o primeiro Funding Loan contribuiu para o surgimento de uma nova fase na economia da Primeira República: a “era de ouro”, tal como diz o economista brasileiro Winston Fritsch. De fato, o governo do presidente Rodrigues Alves (1902-1906) foi bem mais tranquilo, porque havia investimento estrangeiro direto entrando no país, e porque o Brasil passou a ter grande relevância no mercado mundial de borracha. A abundância de dinheiro permitiu, por exemplo, a retomada de obras públicas (como a construção de rodovias), o reaparelhamento da indústria, e o crescimento do PIB. Contudo, ainda estavam presentes alguns problemas econômicos no Brasil:

  • Valorização do câmbio: O câmbio valorizou-se de tal forma que se tornou impossível mantê-lo à cotação de 12 pence por mil-réis. Para enfrentar isso, o governo criou a Caixa de Conversão (1906) — um mecanismo de emissão de notas conversíveis em ouro (e vice-versa), a uma taxa de câmbio fixa. Na prática, isso significava que o Brasil iria aderir ao padrão-ouro, para conter a apreciação cambial. Segundo o economista brasileiro Celso Furtado, essa medida tinha como consequência a “socialização de perdas”: o câmbio desvalorizado beneficiava os cafeicultores, que ganhariam mais papel-moeda ao exportarem café para o exterior, às custas de toda a população, que sofreria com importações encarecidas e com a inflação.
  • Queda no preço do café: Devido a uma supersafra no estado de São Paulo, o preço internacional do café despencou. Diante disso, Rodrigues Alves optou por não envolver o governo federal na defesa do preço do café, porque acreditava ser injusto favorecer os cafeicultores por um problema criado por eles mesmos (o excesso de produção). Essa opinião era compartilhada pelos banqueiros Rothschild e pelos estados da Região Nordeste, que não se vinculavam à economia cafeeira.

Como o governo federal não ajudaria os cafeicultores, os estados de Minas Gerais, Rio de Janeiro e São Paulo colaboraram para fazer isso: em 1906, eles criaram o Convênio de Taubaté, para valorizar os preços desse produto. Nos termos do pacto, esses estados contrairiam empréstimos externos para comprar os excedentes de café, armazenariam os estoques em entrepostos comerciais, e cobrariam uma sobretaxa sobre a exportação do produto. Por meio de tais medidas, eles esperavam reduzir a oferta de café e, assim, aumentar seu preço, beneficiando os cafeicultores. No entanto, como argumentado por Celso Furtado, o Convênio de Taubaté tinha uma grande falha: mesmo que ele conseguisse impedir a expansão da oferta de café do Brasil, a valorização de preços feita por ele estimularia outros países a ingressarem no mercado internacional do café.

Em 1907, São Paulo iniciou o esquema de valorização do café, apoiado por um empréstimo externo. Graças ao Convênio de Taubaté e ao padrão-ouro, os governos de Afonso Pena (1906-1909) e Nilo Peçanha (1909-1910) foram caracterizados por prosperidade econômica. As exportações e as importações do Brasil aumentaram, assim como a oferta de moeda e as reservas internacionais do país. Além disso, as indústrias brasileiras puderam importar maquinário com mais facilidade. O único problema nesse cenário eram as pressões inflacionárias, em decorrência da maior entrada de moeda estrangeira na economia.

O impacto da 1GM e o segundo Funding Loan

De 1910 a 1914, o presidente Hermes da Fonseca governou o Brasil sem o apoio da elite cafeeira, e passou a enfrentar alguns problemas:

  • Retomada do pagamento do principal da dívida externa, nos termos do primeiro Funding Loan. Uma vez que passaram a sair do país grandes quantidades de moeda estrangeira, houve uma redução na quantidade de moeda doméstica também, em linha com o padrão-ouro.
  • Declínio do ciclo da borracha: Na Ásia, surgiram seringais plantados por ingleses e holandeses, que produziam uma borracha melhor e mais barata. Com isso, o Brasil perdeu o destaque no mercado internacional da borracha.
  • Queda do preço do café: Devido a uma ação judicial antitruste nos Estados Unidos, parte do estoque de café brasileiro teve de ser vendido.

O Brasil era prejudicado pelo funcionamento normal do padrão-ouro, que levava a uma saída de divisas do país, porém acreditava conseguir facilmente um financiamento externo para compensar isso. Na verdade, a partir de 1912, surgiram dificuldades para levantar novos empréstimos junto aos credores, porque eles preocupavam-se com o crescimento das despesas governamentais e com a deterioração política na Europa, especialmente nos Bálcãs. As negociações entre o governo brasileiro e seus credores foram suspensas em 27 de junho de 1914.

Em 28 de julho de 1914, a Primeira Guerra Mundial (1GM) eclodiu, e o Brasil reagiu prontamente. A Caixa de Conversão foi fechada, o que significava a adoção do câmbio flutuante, com tendência de desvalorização, pois havia escassez de libras em meio ao cenário de guerra. Além disso, o Brasil decretou a moratória de sua dívida externa e passou a emitir notas inconversíveis.

Em setembro de 1914, o Brasil retomou as negociações com os credores, com vistas a um segundo Funding Loan. No mesmo ano, esse acordo foi firmado entre o governo brasileiro e os ingleses (Rothschild), os franceses e os alemães. O Brasil pegaria emprestado 15 milhões de libras. Tal como no primeiro Funding Loan, o pagamento dos juros estaria suspenso por 3 anos, o pagamento do principal da dívida estaria suspenso por 13 anos, e as parcelas estariam divididas em 50 anos. Todavia, dessa vez, a renda de todas as Alfândegas do Brasil — e não apenas aquela do Rio de Janeiro — foi oferecida como garantia.

Inicialmente, o Brasil não foi tão afetado pela 1GM. Contudo, ao longo do governo de Venceslau Brás (1914-1918), os problemas aumentaram. Por um lado, as importações brasileiras eram prejudicadas pelas dificuldades em trazer maquinário da Europa. Por outro lado, as exportações brasileiras eram prejudicadas pelo torpedeamento de navios mercantes por parte da Alemanha, pela retração nos preços do café e da borracha, e pelo confisco de estoques de café brasileiro na Alemanha pelos Aliados. Diante desse cenário adverso, o Brasil adotou uma política fiscal contracionista e uma política monetária expansionista — por exemplo, pela expansão do crédito ofertado pelo Banco do Brasil, especialmente no interior do país, na época das colheitas rurais.

Apesar dessas dificuldades, de acordo com Celso Furtado, houve um “surto industrial” no Brasil durante a 1GM. Foi uma forte expansão industrial do país — embora momentânea, frágil e insustentável —, causada por vários fatores:

  • Empecilhos à importação de produtos europeus em meio à guerra: Os produtos estrangeiros que chegavam ao Brasil eram poucos e caros.
  • Presença de capacidade industrial ociosa no Brasil: Graças à “era de ouro” da Primeira República, o Brasil pôde importar uma grande quantidade de maquinário industrial. Quando a guerra eclodiu, isso compensou em parte os males no mercado internacional de maquinário industrial.
  • Câmbio desvalorizado: Como havia uma escassez de libras esterlinas, os produtos nacionais eram relativamente mais baratos do que os importados, o que estimulava a indústria nacional.
  • Investimentos na indústria: Com o declínio do café, muitos cafeicultores passaram a investir em empreitadas industriais.

Em meio à guerra, de 1917 até 1919, o governo Venceslau Brás implementou um segundo plano de defesa do preço do café. Ao contrário do Convênio de Taubaté, esse segundo plano não envolvia empréstimos externos — ele era financiado completamente pela emissão de moeda. Essa intervenção teve menos eficácia do que a anterior, porém, em 1918, as preocupações relativas ao café acabaram afortunadamente. Devido a uma forte geada na lavoura, o preço internacional do café praticamente dobrou (temporariamente) nesse ano.

Do crescimento à recessão no pós-1GM

Em 1919, o presidente Epitácio Pessoa começou a governar em um cenário de crescimento econômico do pós-guerra, mesmo diante da apreciação do câmbio brasileiro. Naquele momento, o café estava em alta, a demanda externa por produtos brasileiros recuperava-se, e ainda havia obstáculos à importação de produtos europeus. Aproveitando-se desse contexto, o governo inaugurou um grande programa de obras públicas — algumas, inclusive, relacionadas com as comemorações para o centenário da Independência do Brasil, em 1922.

Entretanto, na virada de 1920 para 1921, o cenário econômico mudou. Diante de uma inflação no pós-guerra, a Europa e os Estados Unidos adotaram políticas contracionistas. Assim, o preço do café tombou e surgiu uma recessão no Brasil. Para o governo de Epitácio Pessoa, as principais preocupações nessa época eram conter a desvalorização do câmbio (que poderia impactar negativamente o orçamento, a dívida externa e a inflação) e conter a crise no setor cafeeiro.

Em 1920, foram realizadas medidas que dariam liquidez para toda a economia, e não apenas para os cafeicultores. Houve uma pequena emissão de notas do Tesouro Nacional, e foi criada a Carteira de Redesconto do Banco do Brasil. Ela poderia emitir notas do Tesouro e usá-las para pagar por títulos privados pertencentes aos bancos, de modo a injetar dinheiro na economia.

Depois, em 1921, o governo concluiu que tinha de intervir diretamente no mercado cafeeiro, para que a política de contenção da desvalorização cambial não gerasse pressões insuportáveis aos cafeicultores. Nesse sentido, o Brasil decidiu realizar o terceiro plano de defesa do preço do café. Inicialmente, o governo apenas endossou a compra de sacas de café por uma corretora privada e financiou essa operação por meio da Carteira de Redesconto. Com o tempo, o endividamento do Tesouro com o Banco do Brasil fez com que o banco tivesse dificuldades para manter a política cafeeira. Assim, no final de 1921 e em 1922, o governo contraiu empréstimos ingleses para sustentar o preço do café. Tais empréstimos não apenas foram eficazes em realizar a terceira defesa do café, como também contribuíram para melhorar a situação cambial brasileira.

Em 1922, porém, a situação fiscal continuava crítica, uma vez que existia uma gigantesca dívida de curto prazo do Tesouro com o Banco do Brasil. Para que o banco continuasse a financiar o governo, o Congresso autorizou a sua Carteira de Redesconto a redescontar títulos públicos. Em termos práticos, isso provocou uma forte expansão da base monetária, o que alimentava a inflação no país.

Ao final de 1922, o governo de Artur Bernardes (1922-1926) iniciou-se em clima de recuperação econômica. Isso ocorria porque o preço do café aumentava (dada a intervenção bem-sucedida do governo), as importações diminuíam (graças à desvalorização cambial), e o cenário global de deflação não teve grandes impactos no Brasil (pois a base monetária havia sido expandida).

Contudo, as bases que sustentavam a economia brasileira na época eram bastante frágeis, porque o balanço de pagamentos era vulnerável aos problemas no mercado cafeeiro, e porque havia uma crônica crise fiscal. Para solucionar essas mazelas, Artur Bernardes propôs duas grandes medidas:

  • Mudanças na defesa do preço do café: Não haveria mais a compra e estocagem de excedentes pelo governo. Em lugar disso, todo o café seria retido compulsoriamente, em armazéns reguladores, pelo governo. Além disso, o governo não bancaria mais o esquema de valorização. Em vez disso, os cafeicultores bancariam a operação e, para pagar os custos de produção, teriam de contrair empréstimos garantidos pelo ‘certificado de depósito’ do café. Por fim, o órgão responsável por gerir o setor cafeeiro seria o recém-criado Instituto de Defesa Permanente do Café. Essas medidas visavam a aumentar a arrecadação, apreciar o câmbio e fortalecer o balanço de pagamentos.
  • Ajuste fiscal: Houve uma drástica redução do déficit público, em grande parte possibilitada pela redução dos investimentos públicos no curto prazo e pela criação do Imposto de Renda, em 1922.

O problema era que ambas essas medidas eram minadas pelo efeito da política monetária, que se tornava, cada vez mais, expansionista. Para sustentar o preço do café, era fundamental que houvesse uma instituição que atuasse mesmo quando os bancos comerciais nacionais não quisessem ou não conseguissem. No entanto, os bancos estrangeiros não se dispunham a ter esse papel. Diante disso, o governo fez uma reforma monetária, fechando a Carteira de Redesconto e transferindo o poder de emitir papel-moeda do Tesouro para o Banco do Brasil. Na prática, o banco conseguiria financiar a política cafeeira de modo bastante parecido com o qual a financiava na vigência da Carteira de Redesconto. Todavia, o emissionismo monetário acarretou uma crise inflacionária e cambial.

Para enfrentar essa crise, inicialmente se buscou um novo empréstimo perante os britânicos, em troca da execução de reformas econômicas. Nesse sentido, no início de 1924, o Brasil recebeu uma missão de peritos chefiada por Edwin Samuel Montagu, que sugeriu reformas como a venda de 50% do Banco do Brasil aos estrangeiros — o que o governo aceitou, mas os Rothschild não. Entretanto, em meados do mesmo ano, o governo da Grã-Bretanha impôs restrições à concessão de empréstimos externos, porque queria fortalecer a libra esterlina. Como o Brasil não teria socorro externo, o país teve de adotar medidas muito contracionistas. Além disso, a responsabilidade pelo financiamento do setor cafeeiro passou do governo federal para o estado de São Paulo em 1924, com a criação do Instituto Paulista de Defesa Permanente do Café (IPDPC). Dois anos depois, o nome desse órgão seria trocado para Instituto do Café do Estado de São Paulo.

O ajuste recessivo conduzido por Artur Bernardes conseguiu conter a inflação e melhorar o câmbio, mas teve um alto custo econômico e político. A economia retrocedeu, o desemprego aumentou, e o câmbio valorizou em mais de 40%. Ademais, como o presidente era oriundo do estado de Minas Gerais, seu governo contribuiu para deteriorar a relação entre as elites políticas paulistas e mineiras.

Do crescimento aos efeitos da Crise de 1929

Em 1926, Washington Luís assumiu a presidência do Brasil tendo como principal proposta econômica o retorno ao padrão-ouro, em contexto no qual não era mais necessário o ajuste recessivo. Com isso, seu ministro da Fazenda, Getúlio Vargas, pôde mudar radicalmente as políticas monetária e cambial.

Para os cafeicultores, era interessante conter a apreciação cambial, de modo que os seus ganhos ao exportar café fossem mantidos. Com esse objetivo, foi criada a Caixa de Estabilização, que seguia os moldes da antiga Caixa de Conversão: ela emitiria notas conversíveis contra depósitos em ouro feitos nela. A conversão entre papel-moeda e ouro ocorreria pela taxa desvalorizada de 6 pence por mil-réis, o que representava uma grande mudança com relação às taxas anteriores. O intuito era que, quando houvesse ouro o suficiente, o Brasil adotaria uma nova moeda (o cruzeiro) e toda a base monetária seria conversível ao ouro.

Em 1927 e 1928, a economia brasileira esteve em boas condições. Washington Luís manteve a moderação nos gastos públicos, e o balanço de pagamentos estava estabilizado pelo padrão-ouro. Como entrava investimento externo abundantemente no país, o PIB brasileiro crescia e a demanda estava aquecida.

Contudo, a economia assentava-se sobre bases frágeis, pois dependia de condições externas favoráveis. Se a demanda mundial por café brasileiro reduzisse, entrariam menos recursos no Brasil e, devido ao padrão-ouro, a liquidez doméstica diminuiria. Além disso, se retração na demanda mundial fosse acompanhada de uma retração no crédito externo, o Brasil também não conseguiria empréstimos externos para financiar a defesa do café. Em outras palavras, em um momento de saída de capitais do Brasil, o país seria violentamente atingido pela lógica de funcionamento do padrão-ouro.

Como já se percebia essa vulnerabilidade, o governo brasileiro optou por uma política contracionista em 1928, na tentativa de reduzir o risco de problemas causados pelo padrão-ouro no futuro. Logo depois, a situação piorou, porque uma supersafra de café fez com que os preços desse produto caíssem. Em 1929, o Brasil foi fortemente afetado pela Crise de 1929, que causou imensa fuga de capitais e tornou reais os medos relativos à economia brasileira. De imediato, houve queda nas exportações, na arrecadação do governo, no consumo, nos investimentos e nas reservas internacionais brasileiras. A resolução desses problemas, porém, ficaria a cargo de Getúlio Vargas, que deu um golpe de Estado contra Washington Luís e assumiu o poder na Revolução de 1930.

Conclusão

Para vários autores, a economia brasileira na Primeira República foi caracterizada por idas e vindas. Naquela época, o Brasil era um país pobre e desigual que fazia experimentos para saber como melhor se integrar à economia liberal internacional. Por isso, observaram-se períodos de crescimento ou de retração econômica, de câmbio fixo ou de câmbio flutuante, de crise fiscal ou de moderação fiscal. A República brasileira herdou a dependência do café que vinha do Período Imperial, porém introduziu indústrias no país e abriu o caminho para uma política industrial consistente, que surgiria na Era Vargas (1930-1945). Como um todo, a economia na Primeira República deve ser lembrada como algo instável, incipiente, porém necessário para a evolução do Brasil.


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