
Em 1994, Henry Kissinger publicou o livro Diplomacia. Ele foi um renomado acadêmico e diplomata que serviu como Conselheiro de Segurança Nacional e Secretário de Estado dos Estados Unidos. Seu livro oferece uma vasta varredura da história das relações exteriores e da arte da diplomacia, com foco particular no século XX e no Mundo Ocidental. Kissinger, conhecido por seu alinhamento com a escola realista das relações internacionais, investiga os conceitos de equilíbrio de poder, raison d’État e Realpolitik em diferentes épocas.
Seu trabalho foi amplamente elogiado por seu escopo e detalhes intrincados. No entanto, também enfrentou críticas por seu foco em indivíduos em detrimento de forças estruturais e por apresentar uma visão reducionista da história. Além disso, os críticos também apontaram que o livro foca excessivamente no papel individual de Kissinger nos eventos, potencialmente exagerando seu impacto. De qualquer forma, suas ideias são dignas de consideração.
Este artigo apresenta um resumo das ideias de Kissinger no vigésimo oitavo capítulo de seu livro, intitulado “Política Externa como Geopolítica: A Diplomacia Triangular de Nixon”.
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A luta de Nixon para retirar os Estados Unidos do Vietnã visava, em última análise, preservar sua posição global. No entanto, mesmo sem o fardo do Vietnã, uma reavaliação da política externa americana era necessária. A era do domínio americano estava desaparecendo à medida que a superioridade nuclear diminuía e o poder econômico era cada vez mais desafiado por uma Europa e um Japão ressurgentes, ambos beneficiados pelo investimento e proteção dos EUA. A Guerra do Vietnã sublinhou a necessidade de uma abordagem sustentável para o papel global da América — uma que evitasse tanto a retirada completa quanto a super-extensão.
Ao mesmo tempo, novas oportunidades diplomáticas surgiram à medida que o bloco comunista se fragmentava. As revelações de Khrushchev em 1956 sobre as atrocidades de Stalin e a invasão soviética da Tchecoslováquia em 1968 enfraqueceram o apelo ideológico do comunismo. Mais significativamente, a crescente divisão entre a China e a União Soviética minou a reivindicação de Moscou à liderança de um movimento comunista unido. Essas mudanças sugeriram uma chance para uma política externa dos EUA mais flexível e estratégica.
Por duas décadas, a política externa americana foi impulsionada pelo idealismo wilsoniano, com líderes se vendo como missionários em um palco global. No final dos anos 1960, no entanto, os EUA estavam atolados no Vietnã e profundamente divididos internamente, necessitando de uma abordagem mais pragmática e comedida. Diferente de Wilson, que havia guiado uma nação otimista e nova nos assuntos internacionais, Nixon herdou um país lutando contra a frustração e a auto-dúvida. Ele teve que definir objetivos de longo prazo que pudessem ser sustentados mesmo diante da adversidade.
Nixon governou uma nação à beira do colapso interno. Alienado do establishment político e desconfiado por muitos de seus membros, ele permaneceu convencido de que a América não poderia abandonar suas responsabilidades globais. Poucos presidentes foram tão complexos quanto Nixon — introvertido e determinado, inseguro e resoluto, cético em relação aos intelectuais, mas altamente analítico. Embora lutasse para se conectar com o público em nível pessoal, ele guiou com sucesso a América através de sua transição do domínio para a liderança, forçando-a a navegar por um mundo que nunca havia compreendido totalmente.
Nenhum presidente americano teve maior domínio dos assuntos internacionais do que Nixon. Exceto por Theodore Roosevelt, nenhum havia viajado tanto ou se envolvido tão profundamente com líderes estrangeiros. Embora não fosse um historiador no molde de Churchill ou de Gaulle, Nixon tinha uma habilidade incomum de compreender a dinâmica política de qualquer país que capturasse seu interesse. Enquanto suas estratégias políticas domésticas eram frequentemente obscurecidas pela ambição e insegurança pessoal, seus julgamentos de política externa eram claros, lógicos e sempre focados em promover os interesses americanos.
Diferente de Wilson, Nixon não acreditava na bondade inerente da humanidade ou em uma harmonia inevitável entre as nações. Enquanto Wilson via o mundo progredindo em direção à paz e à democracia, Nixon o via como uma constante disputa de interesses concorrentes, onde a estabilidade só poderia ser preservada através de esforço vigilante. Ele rejeitou a ideia de que a segurança coletiva por si só poderia garantir a paz, acreditando, em vez disso, que a realpolitik e um equilíbrio de poder eram essenciais para manter a ordem global.
O conceito de interesse nacional de Nixon ia contra o idealismo prevalecente da época. Ele acreditava que se as grandes potências, incluindo os EUA, agissem racionalmente e previsivelmente na busca de seus interesses, um equilíbrio estável emergiria de sua competição. Como Theodore Roosevelt, ele via o equilíbrio de poder como a chave para a estabilidade e considerava uma América forte essencial para a segurança global. Embora fora de moda, essa abordagem era central para sua visão estratégica.
Em uma entrevista de 1972 para a revista Time, Nixon articulou sua crença de que a paz historicamente só havia sido mantida quando existia um equilíbrio de poder. Ele argumentou que EUA, Europa, União Soviética, China e Japão fortes e estáveis criariam um mundo mais seguro e equilibrado. Ao mesmo tempo, Nixon refletia as contradições da sociedade americana — pragmático e obstinado, mas ainda apegado às suas tradições idealistas. Ironicamente, o presidente que ele mais admirava era Woodrow Wilson, apesar de suas visões de mundo totalmente diferentes. Nixon demonstrou sua reverência colocando o retrato de Wilson na Sala do Gabinete e escolhendo sua mesa — apenas para descobrir mais tarde que pertencia a Henry Wilson, vice-presidente de Ulysses Grant.
Apesar de sua abordagem de realpolitik, Nixon frequentemente invocava a retórica wilsoniana, enfatizando a liderança moral da América. Ele falava do dever da nação de fornecer um exemplo de liderança espiritual além do mero poder militar ou econômico. Ele assegurou ao mundo que os EUA não buscavam expansão territorial, nem dominação sobre outros, e usariam seu poder exclusivamente para preservar a paz e defender a liberdade. Essas declarações, no entanto, coexistiam com sua firme crença no auto-interesse nacional, criando uma síntese inovadora da política externa americana.
Nixon levava o idealismo americano a sério, acreditando no papel indispensável do país no cenário mundial. No entanto, ele também aceitou a realidade de que a América não podia mais se dar ao luxo de cruzar por seus valores através da intervenção militar. Sua política externa refletia um delicado ato de equilíbrio: usar a retórica wilsoniana para inspirar enquanto confiava na realpolitik para navegar nas complexidades do poder global. Ele entendia que, embora os americanos anseiassem por uma política externa altruísta, os líderes mundiais preferiam uma abordagem americana previsível e orientada por interesses.
Ironicamente, o compromisso de Nixon em manter a liderança global da América o colocou em conflito com muitas figuras contemporâneas que antes haviam defendido o Wilsonianismo, mas agora advogavam uma retirada das responsabilidades internacionais. Mesmo enquanto Nixon reduzia os compromissos da América em comparação com seus predecessores, ele via como seu dever definir um papel sustentável para uma nação idealista, porém sobrecarregada. Em sua visão, o idealismo wilsoniano e a realpolitik não eram mutuamente exclusivos, mas sim forças complementares que moldavam o engajamento da América com o mundo.
A estratégia inicial de contenção da Guerra Fria colocou os EUA no centro de todas as crises globais, enquanto a retórica ambiciosa da era Kennedy estabeleceu metas irrealistas. No final dos anos 1960, o idealismo americano havia se transformado em desilusão, e a oposição à super-extensão arriscava se transformar em isolacionismo total. Nixon buscou restaurar a perspectiva, reconhecendo que os EUA permaneciam indispensáveis para a estabilidade global, mas não podiam mais se dar ao luxo de intervir sem objetivos estratégicos claros. Ele entendeu que a sobrevivência do mundo dependia das relações EUA-União Soviética, enquanto a paz exigia que a América distinguisse cuidadosamente entre engajamentos vitais e aqueles que eram opcionais.
Nixon escolheu um momento inesperado para introduzir essa mudança de política. Em 25 de julho de 1969, enquanto visitava Guam como parte de uma turnê mundial, ele testemunhou o pouso na água dos primeiros astronautas a pousar na Lua. Aproveitando a oportunidade da mídia, ele espontaneamente delineou novos princípios para o envolvimento dos EUA no exterior. Esses princípios, mais tarde conhecidos como a Doutrina Nixon, sinalizaram uma recalibração do papel da América: os EUA apoiariam aliados, mas esperariam que eles assumissem a responsabilidade primária por sua própria defesa. Nixon elaborou essa abordagem em um discurso de novembro de 1969 e a esclareceu ainda mais em seu relatório de política externa de fevereiro de 1970, que se tornou uma tradição anual durante sua presidência.
A Doutrina Nixon abordou o paradoxo dos engajamentos militares da América na Coreia e no Vietnã — ambos os conflitos ocorreram em regiões sem compromissos formais dos EUA. Nixon visava equilibrar a super-extensão com a contenção, estabelecendo três princípios para o envolvimento dos EUA: honrar as obrigações de tratados, proteger os aliados de ameaças nucleares e esperar que as nações ameaçadas assumissem a responsabilidade primária por sua própria defesa convencional. No entanto, esses critérios não eram diretos na prática. O compromisso de defender aliados levantou questões sobre o que definia um interesse de segurança “vital” e se ameaças não nucleares justificavam intervenção. Além disso, confiar nos aliados para reforçar seus próprios esforços de defesa criou um dilema: se os interesses dos EUA fossem primordiais, a América ainda interviria mesmo que um aliado não contribuísse suficientemente? Esse desafio prenunciou debates posteriores sobre a partilha de encargos dentro das alianças.
A Doutrina Nixon era particularmente relevante em regiões periféricas ameaçadas por forças apoiadas pelos soviéticos, mas, ironicamente, foi projetada para evitar outra intervenção do tipo Vietnã, tornando-a mais aplicável a uma situação que Nixon estava determinado a não repetir. Na época em que Nixon assumiu o cargo, as relações Leste-Oeste mais amplas precisavam de reavaliação. A Guerra Fria havia empurrado a América para o engajamento global, e o trauma do Vietnã tornou imperativa a reavaliação desse engajamento. O debate sobre a contenção, no entanto, há muito era moldado por suposições ideológicas simplistas em vez de realidades geopolíticas. Alguns formuladores de políticas viam a União Soviética como inerentemente comprometida com a dominação mundial e se recusavam a negociar até que Moscou abandonasse sua ideologia. Outros, adotando uma perspectiva psicológica, argumentavam que a agressão soviética era uma reação à insegurança e que a diplomacia paciente poderia encorajar um comportamento soviético mais cooperativo.
Essas duas perspectivas dominantes — uma tratando a política externa como uma batalha moral e a outra como um exercício psicológico — ambas falharam em resolver a questão fundamental de como negociar com a União Soviética. No início dos anos 1970, surgiu uma escola de pensamento mais radical, argumentando que a contenção era desnecessária. Defensores dessa visão, como Norman Mailer, afirmavam que o comunismo acabaria por entrar em colapso sob suas próprias contradições e que a oposição dos EUA apenas o fortalecia. Essa perspectiva, que invertia a doutrina de contenção, sugeria que permitir a expansão comunista aceleraria sua queda. Alguns intelectuais apoiaram essa ideia através da “teoria da convergência”, que sustentava que as sociedades capitalistas e comunistas estavam evoluindo naturalmente para sistemas semelhantes, tornando a oposição dos EUA ao comunismo fútil.
A contenção tradicional havia levado à estagnação diplomática, enquanto alternativas radicais clamavam pelo abandono de décadas de compromisso. Nixon rejeitou ambos os extremos e, em vez disso, priorizou o interesse nacional como fundamento da política externa. Seus relatórios anuais presidenciais de política externa, publicados pela primeira vez em 1970, articularam essa abordagem. Esses relatórios esclareceram que os compromissos dos EUA não eram obrigações estáticas, mas sim escolhas estratégicas moldadas por interesses nacionais. Nixon enfatizou que a política externa deveria ser baseada em uma avaliação realista dos interesses, não em compromissos legalistas. Nos EUA, essa postura foi inovadora — ao contrário das potências europeias, onde tal pragmatismo era dado como certo, os presidentes americanos historicamente enquadravam a política externa em termos morais, tornando a priorização explícita do interesse nacional por Nixon altamente incomum.
A política de Nixon em relação à União Soviética refletia esse realismo. Ele descartou tanto o otimismo ingênuo sobre as intenções soviéticas quanto a rigidez ideológica que impedia a negociação. Em vez disso, ele insistiu que as relações soviético-americanas deveriam ser julgadas por acordos concretos baseados em interesses mútuos, e não em retórica abstrata. O relatório de política externa de 1971 reafirmou que os EUA se engajariam com a União Soviética pragmaticamente, rejeitando seu sistema interno, mas focando em seu comportamento externo. Essa abordagem atraiu críticas, especialmente de conservadores que mais tarde argumentaram que Nixon depositava muita fé nos líderes soviéticos. No entanto, a ênfase de Nixon no interesse nacional não era sobre confiar em Moscou, mas sobre garantir uma estratégia que pudesse tanto resistir à expansão soviética quanto manter o apoio doméstico.
Na prática, a postura de Nixon sobre a contenção não era diferente da de seus predecessores como Acheson e Dulles ou de seu sucessor Ronald Reagan. Apesar dos desafios contínuos da Guerra do Vietnã, sua administração foi rápida em contrapor movimentos geopolíticos soviéticos, fosse em Cuba, no Oriente Médio ou no Sul da Ásia. No entanto, ao contrário de Acheson e Dulles, Nixon não insistiu na transformação ideológica soviética antes de se engajar em negociações. Em vez disso, ele adotou uma abordagem reminiscente de Churchill, que havia defendido conversas com Moscou após a morte de Stalin. Nixon acreditava que o engajamento diplomático sustentado e a competição prolongada com o Ocidente eventualmente empurrariam o sistema soviético para a mudança, fortalecendo a posição das nações democráticas.
A estratégia de negociações de Nixon foi projetada não apenas para gerenciar as relações com a União Soviética, mas também para permitir que os Estados Unidos recuperassem a iniciativa diplomática enquanto ainda estavam engajados no Vietnã. Seu objetivo era conter a influência do Movimento pela Paz para que ele permanecesse focado no Vietnã, em vez de paralisar toda a política externa dos EUA. Mais do que uma tática de curto prazo, Nixon e seus conselheiros acreditavam que um alinhamento temporário de interesses entre as duas superpotências nucleares poderia permitir um período de tensões amenizadas. O equilíbrio nuclear parecia estar se estabilizando e, com as negociações certas ou ações unilaterais, poderia ser ainda mais solidificado. Os EUA precisavam de tempo para sair do Vietnã e elaborar uma nova política externa pós-guerra, enquanto a União Soviética, enfrentando tensões crescentes com a China, tinha um incentivo ainda mais forte para desescalar. A equipe de Nixon calculou que prolongar o engajamento soviético com o Ocidente sobrecarregaria a capacidade de Moscou de manter seu império, particularmente dada sua estagnação econômica. Eles acreditavam que o tempo favorecia os Estados Unidos, não o mundo comunista.
A abordagem de Nixon à União Soviética era mais sofisticada do que a de seus predecessores. Ele não via a Guerra Fria como uma luta binária de confronto ou apaziguamento, mas como uma relação dinâmica com áreas tanto de conflito quanto de cooperação potencial. Sua estratégia — mais tarde caricaturada como mera détente — baseava-se no uso da cooperação em algumas áreas para influenciar o comportamento soviético em outras. Ele buscou vincular diferentes aspectos da relação entre as superpotências, garantindo que os incentivos soviéticos para o engajamento se estendessem além do controle de armas e para uma moderação geopolítica mais ampla.
Essa política de “linkage” (vinculação), no entanto, enfrentou numerosos desafios. Um dos maiores obstáculos era o forte foco dos formuladores de políticas americanos no controle de armas. Em décadas anteriores, o desarmamento visava reduzir os estoques de armas a níveis não ameaçadores, mas na era nuclear, tal objetivo era quase impossível. A imprevisibilidade de uma capacidade de primeiro ataque — onde um lado poderia eliminar o arsenal nuclear do outro antes da retaliação — era uma preocupação central. O trabalho do analista da Rand Corporation, Albert Wohlstetter, em 1959, destacou a instabilidade da dissuasão nuclear, mostrando que um adversário poderia, sob certas condições, atacar primeiro e emergir com vantagem. Esse medo de um ataque surpresa alimentou intensas discussões acadêmicas e estratégicas, moldando a política nuclear dos EUA por décadas.
À medida que os debates sobre o controle de armas se intensificaram, eles revelaram seu próprio conjunto de problemas. A complexidade do assunto dificultava a compreensão completa por parte dos formuladores de políticas e do público, levando a ansiedades aumentadas. As decisões sobre estratégia nuclear não eram tomadas por cientistas, mas por líderes políticos, que compreendiam os riscos catastróficos de um erro de cálculo. Durante a Guerra Fria, nem os EUA nem a União Soviética tiveram experiência real no lançamento de cenários de guerra nuclear em grande escala, e nenhum dos lados jamais testou um míssil de um silo operacional, tornando todo o conceito de estabilidade estratégica teórico. O medo de um ataque surpresa foi, portanto, exagerado por dois grupos opostos — aqueles que defendiam orçamentos de defesa mais altos para se proteger contra tal ataque e aqueles que o usavam como argumento para reduzir os gastos militares.
Durante o auge dos debates sobre controle de armas na década de 1970, críticos conservadores alertaram contra a confiança na liderança soviética, enquanto defensores do controle de armas argumentavam que os próprios acordos contribuíam para uma atmosfera de melhores relações, independentemente de seu valor estratégico. Este debate espelhava a divisão anterior entre aqueles que viam a Guerra Fria em termos ideológicos e aqueles que a viam como uma questão de engajamento psicológico com os soviéticos. Inicialmente, o controle de armas foi simplesmente adicionado à estratégia de contenção como forma de gerenciar seus riscos, mas com o tempo, tornou-se um substituto para o engajamento diplomático sério. Em vez de buscar soluções políticas, os EUA e a União Soviética focaram em gerenciar sua rivalidade através de negociações de controle de armas, prendendo ambos os lados em um impasse prolongado.
Quando Nixon assumiu o cargo, o Congresso e a mídia o pressionavam para iniciar negociações de controle de armas com Moscou. No entanto, ele relutava em prosseguir como se nada tivesse acontecido poucos meses após as tropas soviéticas invadirem a Tchecoslováquia. Nixon queria garantir que as conversas sobre controle de armas não servissem de cobertura para o expansionismo soviético. Sua administração perseguiu a “linkage”, esperando usar o interesse soviético nas negociações para extrair concessões em outras questões críticas, como a redução das tensões em Berlim, a abordagem dos conflitos no Oriente Médio e, o mais importante, o fim da Guerra do Vietnã.
Na diplomacia, a capacidade de reconhecer questões interconectadas é crucial. Nixon acreditava que o engajamento diplomático em uma área não poderia ser totalmente separado dos confrontos em outras. Ele rejeitou a abordagem da administração anterior de tratar o controle de armas como uma questão isolada, insistindo, em vez disso, que fizesse parte de um quadro estratégico mais amplo. Ele articulou essa posição em uma carta para sua equipe de segurança nacional em 4 de fevereiro de 1969, apenas duas semanas após tomar posse. Nixon deixou claro que, embora questões bilaterais menores pudessem ser isoladas de conflitos mais amplos, os principais desafios políticos e militares tinham que ser abordados juntos.
O conceito de linkage enfrentou forte resistência do establishment da política externa. A burocracia diplomática americana, profundamente investida no controle de armas e na manutenção do diálogo com os “moderados” soviéticos, opôs-se à ideia de condicionar as negociações ao comportamento soviético em outras áreas. A imprensa também contribuiu para minar a linkage. Vazamentos de dentro da administração retratavam os acordos de armas como o objetivo principal da política externa de Nixon, apesar de sua insistência em condições estratégicas mais amplas. Reportagens no The New York Times e no The Washington Post criaram expectativas de que as conversas sobre armas com Moscou começariam em meses, pressionando efetivamente a administração a avançar.
Críticos na mídia e na academia atacaram a abordagem de Nixon, argumentando que vincular o controle de armas a preocupações geopolíticas mais amplas era impraticável. Eles descartaram restrições comerciais e alavancagem diplomática como “políticas da Guerra Fria” inconsistentes com a própria retórica de Nixon sobre passar do confronto para a negociação. Alguns argumentaram que era irrealista esperar que diferentes conflitos internacionais fossem resolvidos em conjunto. A tentativa inicial de Nixon de usar a linkage — enviando Cyrus Vance a Moscou para negociar tanto o controle de armas quanto o Vietnã — falhou porque as duas questões eram muito complexas e envolviam diferentes escalas de tempo.
Apesar desses obstáculos, Nixon e sua equipe finalmente conseguiram integrar diferentes vertentes da política. O avanço veio por um caminho inesperado — sua dramática abertura para a China. Na diplomacia, ter múltiplas opções estratégicas limita as escolhas de um adversário e aumenta a alavancagem de alguém. Ao melhorar as relações com a China, Nixon garantiu que a União Soviética não pudesse mais dar como certa uma divisão permanente entre a democracia mais poderosa do mundo e seu estado comunista mais populoso. Moscou agora tinha que considerar a possibilidade de cooperação sino-americana, o que a forçou a adotar uma abordagem mais cautelosa em relação aos EUA.
Essa mudança foi crítica para a estratégia mais ampla de Nixon. Se a União Soviética temesse laços mais estreitos entre EUA e China, seria mais provável que moderasse seu comportamento global para evitar empurrar Washington e Pequim para um alinhamento anti-soviético. Dessa forma, a reaproximação EUA-China tornou-se um elemento chave da política soviética de Nixon, reforçando seus esforços para alcançar um equilíbrio de poder mais favorável e influenciar a dinâmica global da Guerra Fria.
A hostilidade americana de longa data em relação à China Comunista começou após a vitória das forças de Mao Zedong na guerra civil de 1949 e se intensificou com a intervenção da China na Guerra da Coreia em 1950. Os Estados Unidos responderam isolando diplomaticamente Pequim, exemplificado pela recusa do Secretário de Estado John Foster Dulles em apertar a mão do Premier Zhou Enlai na Conferência de Genebra de 1954. Por décadas, o único canal diplomático entre as duas nações foram reuniões esporádicas de embaixadores em Varsóvia, que consistiam principalmente na troca de hostilidades. A ruptura se aprofundou durante a Revolução Cultural da China, um período de convulsão em massa comparável aos expurgos de Stalin, durante o qual a China retirou quase todos os seus embaixadores, encerrando efetivamente o pouco contato diplomático que restava com os Estados Unidos.
Enquanto os formuladores de políticas americanos ignoravam em grande parte os potenciais benefícios estratégicos da divisão sino-soviética, dois dos estadistas mais experientes da Europa, Konrad Adenauer e Charles de Gaulle, viram uma oportunidade. No final da década de 1950, Adenauer especulou que as tensões sino-soviéticas poderiam ser aproveitadas em benefício do Ocidente, embora a Alemanha Ocidental não tivesse o poder diplomático para agir. De Gaulle, no entanto, não estava limitado por tais limitações. Ele reconheceu cedo que a União Soviética enfrentava um sério desafio ao longo de sua vasta fronteira chinesa e acreditava que isso empurraria Moscou para uma maior cooperação com o Ocidente. Sua visão de uma détente franco-soviética, que ele esperava que desmantelasse a divisão da Europa da Guerra Fria, era, em última análise, irrealista — Paris não era poderosa o suficiente para que Moscou a considerasse uma parceira igual. No entanto, sua análise fundamental estava correta: a divisão soviético-chinesa apresentava uma oportunidade para a diplomacia ocidental.
Em Washington, no entanto, as visões sobre a China permaneceram profundamente entrincheiradas ao longo das linhas ideológicas da Guerra Fria. Alguns sinólogos argumentavam que os EUA deveriam melhorar as relações reconhecendo diplomaticamente Pequim e permitindo que ela ocupasse o assento da China nas Nações Unidas. Mas a visão dominante sustentava que a China Comunista era expansionista, ideologicamente rígida e determinada a espalhar a revolução. Essa percepção havia justificado o envolvimento americano no Vietnã, visto como uma forma de combater a expansão comunista liderada pela China no Sudeste Asiático. Mesmo alguns dos mesmos sovietólogos que há muito pediam diálogo com Moscou agora argumentavam que abrir laços com Pequim provocaria os soviéticos e arriscaria o confronto.
Nixon e sua administração rejeitaram a noção de que isolar a China era do interesse da América. Ele via a diplomacia com Pequim como uma ferramenta essencial para fortalecer a posição global da América. Em uma declaração de política de 1968 durante a candidatura presidencial de Nelson Rockefeller, Nixon havia escrito que os EUA deveriam “iniciar um diálogo com a China comunista” como parte de uma relação triangular estratégica com Moscou e Pequim. Mais tarde naquele ano, ele reiterou essa ideia na Foreign Affairs, escrevendo que os EUA não podiam se dar ao luxo de deixar a China “em isolamento raivoso”. A abordagem de Nixon estava fundamentada no pragmatismo estratégico — expandir as opções diplomáticas dos EUA tornaria tanto a China quanto a União Soviética mais cautelosas em suas relações com Washington.
Na realidade, o eventual movimento da China em direção à reintegração na comunidade internacional foi impulsionado menos por um desejo de diálogo com os EUA e mais pelo medo de seu suposto aliado, a União Soviética. A compreensão de Washington sobre a relação sino-soviética evoluiu dramaticamente no início de 1969, após uma série de confrontos fronteiriços entre forças chinesas e soviéticas ao longo do rio Ussuri. Inicialmente, as autoridades americanas presumiram que esses incidentes foram provocados pela liderança radical da China. No entanto, a incomum ânsia dos diplomatas soviéticos em informar Washington sobre o conflito levantou suspeitas. As avaliações de inteligência logo revelaram que os confrontos ocorriam consistentemente perto das bases de suprimento soviéticas, e não das posições chinesas — sugerindo que Moscou, e não Pequim, era o agressor. Um massivo acúmulo militar soviético ao longo da fronteira de 4.000 milhas reforçou ainda mais a possibilidade de que a União Soviética estivesse considerando uma ação militar contra a China.
Se a análise da administração Nixon estivesse correta, um ataque soviético à China desencadearia a crise global mais perigosa desde a Crise dos Mísseis de Cuba. Caso Moscou tentasse impor seu domínio sobre a China como havia feito sobre a Tchecoslováquia em 1968, o país mais populoso do mundo se tornaria um cliente subordinado da União Soviética — recriando o temido bloco sino-soviético dos anos 1950. Este era um cenário que Washington não podia se dar ao luxo de ignorar. Um ataque soviético bem-sucedido à China alteraria irreversivelmente o equilíbrio global de poder, e esperar para reagir depois do fato seria tarde demais.
Reconhecendo a urgência, Nixon tomou duas decisões cruciais em meados de 1969. Primeiro, ele deixou de lado as questões de longa data nas relações EUA-China, como Taiwan e disputas comerciais, para se concentrar no quadro geopolítico mais amplo. Se a China e a União Soviética tivessem mais medo uma da outra do que dos EUA, existia uma oportunidade única para a diplomacia. Nixon calculou que uma mudança estratégica nas relações sino-americanas poderia surgir naturalmente, com disputas tradicionais se resolvendo à medida que a cooperação se aprofundasse.
A segunda e mais ousada decisão foi emitir um aviso velado à União Soviética de que os Estados Unidos não ficariam de braços cruzados se Moscou atacasse a China. Em 5 de setembro de 1969, o Subsecretário de Estado Elliot Richardson fez uma declaração cuidadosamente elaborada declarando que os EUA estavam “profundamente preocupados” com qualquer escalada do conflito sino-soviético. Embora formulada em termos neutros, esta foi uma mensagem clara de que Washington não toleraria a agressão soviética contra Pequim. Ao se recusar a explorar a divisão sino-soviética, mas deixando claro que poderia, Nixon sinalizou tanto para Moscou quanto para Pequim que um realinhamento da política dos EUA estava em andamento.
Em 1970 e 1971, os relatórios anuais de política externa de Nixon reforçaram essa mensagem. Ele afirmou que os EUA estavam preparados para abrir um diálogo direto com a China, deixando claro que a América não tinha intenção de conspirar com a União Soviética contra Pequim. Essa estratégia pressionou sutilmente ambas as potências comunistas a buscar melhores relações com Washington. Se qualquer um dos lados temesse que os EUA se aproximassem de seu rival, tinha um incentivo para moderar seu comportamento em relação aos EUA.
Apesar desses sinais, forjar uma nova relação com a China provou ser desafiador devido a décadas de isolamento. Pequim, em particular, lutou para encontrar uma maneira de comunicar suas intenções a Washington. Em 1969, o Ministro da Defesa chinês, Lin Biao, discretamente abandonou as referências aos EUA como o principal inimigo da China, reconhecendo a União Soviética como uma ameaça igual — um pré-requisito essencial para a diplomacia triangular de Nixon. No entanto, os esforços da China para sinalizar sua abertura foram muitas vezes mal compreendidos em Washington. Por exemplo, quando Mao sentou o jornalista americano Edgar Snow ao seu lado no desfile do Dia Nacional de 1970 e mais tarde convidou Nixon a visitar a China através de uma entrevista com Snow, a mensagem nunca chegou ao governo dos EUA porque Snow era considerado um simpatizante comunista e não um intermediário credível.
Em dezembro de 1969, o contato diplomático formal foi retomado em Varsóvia, mas essas conversas entre embaixadores rapidamente estagnaram. Ambos os lados estavam limitados por suas posições de negociação tradicionais e pela necessidade de consultar os interessados políticos domésticos. O progresso permaneceu lento até que o Paquistão, que mantinha relações tanto com Washington quanto com Pequim, interveio para facilitar a diplomacia de bastidores. Esse esforço culminou na decisão histórica de Nixon de enviar Henry Kissinger em uma viagem secreta a Pequim em julho de 1971.
Quando Kissinger chegou, encontrou líderes chineses notavelmente receptivos ao estilo de diplomacia de Nixon. Como Nixon, eles priorizavam o alinhamento estratégico sobre disputas ideológicas. Mao Zedong, Zhou Enlai e, mais tarde, Deng Xiaoping incorporaram cada um um estilo de liderança distinto — Mao como o revolucionário visionário, Zhou como o estadista sofisticado e Deng como o reformador pragmático. Ao contrário de seus homólogos soviéticos, que se concentravam em barganhas rígidas e táticas de pressão implacáveis, os líderes chineses se engajaram em discussões amplas e conceituais destinadas a construir confiança. Mao, por exemplo, rapidamente assegurou a Nixon que Taiwan não era uma preocupação imediata: “Podemos viver sem eles por enquanto, e deixar isso para daqui a 100 anos.”
A reunião Nixon-Mao lançou as bases para o Comunicado de Xangai, assinado em 1972. Este acordo foi único em sua estrutura — em vez de mascarar as diferenças, reconheceu abertamente as visões conflitantes de ambos os lados sobre questões-chave como Taiwan, Vietnã e ideologia. No entanto, o comunicado também afirmou pontos cruciais de acordo: ambas as nações se opunham ao domínio de qualquer país na Ásia, apoiavam a redução de conflitos militares e se comprometiam a melhorar as relações bilaterais. Em essência, embora os EUA e a China não fossem aliados formais, eles concordaram em resistir juntos ao expansionismo soviético.
No ano seguinte, esse alinhamento tornou-se ainda mais claro. Um comunicado conjunto de 1973 elevou sua postura de meramente se opor à “dominação asiática” para resistir à busca de qualquer país pela “dominação mundial” — uma referência não tão sutil às ambições soviéticas. Em menos de dois anos, as relações EUA-China haviam mudado de décadas de hostilidade para uma parceria estratégica implícita contra a União Soviética.
A abertura de Nixon para a China remodelou a diplomacia global, não por manipulação, mas criando um quadro no qual os interesses de ambos os países se alinharam naturalmente. A chamada “carta da China” não era algo que os EUA pudessem jogar à vontade — era, antes, o resultado inevitável do medo da China da agressão soviética e do desejo da América de equilibrar o poder. Ao gerenciar cuidadosamente esse realinhamento, Nixon restaurou a flexibilidade diplomática americana, provando que mesmo adversários ideológicos poderiam encontrar um terreno comum quando os imperativos estratégicos o ditassem.
Após a abertura da América para a China, a União Soviética enfrentou pressão em duas frentes — a OTAN no Ocidente e a China no Leste — forçando-a a reconsiderar sua estratégia. Temendo uma aliança sino-americana mais profunda, Moscou mudou para a détente com Washington, chegando a propor uma quase-aliança contra Pequim, que Nixon rejeitou. Em vez disso, os EUA equilibraram ambas as potências, garantindo a moderação soviética enquanto mantinham a China engajada como contrapeso.
Apesar das previsões de que a reaproximação EUA-China prejudicaria as relações soviéticas, ocorreu o oposto. O Kremlin, que havia protelado uma cúpula com Nixon, reverteu rapidamente o curso após a viagem secreta de Kissinger a Pequim, acelerando as negociações. A política externa de Nixon, fundamentada no interesse nacional em vez da ideologia, remodelou a diplomacia global, mas carecia de apelo emocional para os americanos acostumados à retórica moralista. Diferente de Dulles ou Reagan, a abordagem pragmática de Nixon lutou para se conectar com uma sociedade dividida pelo Vietnã e posteriormente paralisada por Watergate.
Sem Watergate, Nixon poderia ter solidificado sua estratégia, provando que o realismo poderia servir aos ideais americanos. Em vez disso, a combinação do Vietnã e do escândalo minou a unidade nacional, impedindo um consenso duradouro sobre o papel global da América, mesmo quando Nixon deixou o país em uma posição de domínio estratégico.
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